Violência no trabalho em Portugal (II)


Ao rever a série “Uma Casa na Pradaria” deparei-me com mais um exemplo de como o mercado de trabalho em Portugal vive, de facto, na Idade Média.
Na década de 70 do século XIX, o proprietário de uma pedreira no estado do Minesota dava um prémio pecuniário ao trabalhador que partisse mais pedra num determinado período de tempo.
No século XIX, no coração da América selvagem, depois do mau tempo ter destruído as colheitas de toda a região, obrigando os habitantes a percorrer mais de 200 km em busca de trabalho…
Mas, de certa forma, Portugal também já teve os seus exemplos de como uma economia deve funcionar para ser forte: na época dos Descobrimentos, salvo as devidas distâncias sociais e culturais e que não são tão grandes como deveriam.
Os senhores das colónias tinham benefícios sempre um dos seus “feudos” além-mar produzia mais riqueza para o reino. No fundo, de um modo incipiente e socialmente limitado, tratava-se de uma meritocracia.
O conceito perdeu-se no tempo em Portugal, de tal forma que tive a oportunidade de ouvir um empresário nacional – com formação académica, mas, obviamente, sem qualquer contacto com a realidade – classificá-lo como fruto do comunismo. Atribuir um prémio por desempenho é, aliás, uma tradição que o comunismo enraizou pelo mundo ocidental, como todos o sabemos.
Um grande bem-haja a todos os empresários portugueses que se esforçam por inovar, por gerar postos de trabalho e para criarem as condições necessárias para que os seus colaboradores sejam o melhor elo da cadeia produtiva. Mas desses, ninguém fala, a não ser a inveja daqueles que não têm a inteligência nem a moral para serem como eles…

Violência no trabalho em Portugal


A propósito da reportagem de ontem na RTP

Ao assistir ontem à reportagem da RTP sobre o assédio moral no trabalho e as diferentes técnicas de tortura a que estão sujeitos muitos dos trabalhadores portugueses, lembrei-me de uma conversa que tive há alguns tempos atrás com um cidadão norte-americano com quem tive a oportunidade de trocar algumas ideias sobre as diferenças e as semelhanças entre as nossas sociedades.
Pese embora os meus preconceitos, a conversa acabou por se revelar bastante didáctica e agradável, até ao ponto em que, depois de algumas explicações sobre o mercado de trabalho nos dois países, o estrangeiro comentou, em jeito de conclusão de um longo silêncio, “vocês vivem na Idade Média”.
A minha primeira reacção foi de raiva, de entender aquele comentário como mais uma arrogância típica dos norte-americanos, mas bastaram apenas alguns segundos para perceber que, afinal, a criatura tinha razão.
Trocámos mais algumas palavras, nomeadamente, para lhe dizer que muitos empresários portugueses sonham em funcionar como funcionam os empresários norte-americanos, o que provocou uma gargalhada quase demoníaca no gringo. Afinal, como ele próprio disse, se os empresários portugueses funcionassem como os empresários da terra das oportunidades, “fechariam a porta duas semanas depois”.
Perguntei porquê, desejando encontrar um argumento para defender a honra nacional, e o cowboy do asfalto desfiou uma longa lista de razões às quais nada tive para fazer frente, vendo-me obrigada a concordar. E até a achar que seria mesmo melhor que fossemos obrigados a ter um mercado de trabalho como o norte-americano, apesar de todos os seus defeitos.
Os impostos pagos à Administração (a Washington e ao estado onde reside a empresa) foram o seu primeiro argumento: nas suas próprias palavras, a iniciativa privada é profundamente incentivada apenas porque é a forma mais fácil de o Estado norte-americano enriquecer, cobrando os olhos da cara a quem era emprego e lucro e a quem trabalha.
A segunda maior razão são os sindicatos: é que na terra do capitalismo puro, as associações profissionais continuam a inspirar medo, muito mais eficaz do que o respeito. Nem pense em pedir a um paquete que lhe traga um café, pois isso não faz parte das suas funções e é razão suficiente para ter um sindicato à perna para o resto da vida útil de uma empresa.
A terceira razão é, provavelmente, a mais importante: a celeridade da Justiça.
Embora subsistam inúmeras situações injustas no mercado de trabalho, pois nenhum sistema é perfeito, o facto é que quando alguém precisa de se defender, não tem que esperar 20 anos (se não morrer de ataque cardíaco ou se não se suicidar até lá) para que um tribunal se decida a fazer justiça. E é conhecida a apetência dos norte-americanos por pedirem milhões de dólares de indemnizações por dá cá aquela palha. No entanto, isso não parece impedir dos tribunais de funcionarem.
Como o exemplo norte-americano há vários, muitos dos quais serão até mais equilibrados, mas o facto é que a criatura tem razão.
Nada resulta de bom quando uma sociedade tem um mercado de trabalho é formatado apenas para gerar o lucro privado: o Estado perde em todos os sentidos, já que o dinheiro dispendido em baixas médicas provocadas por doenças relacionadas com o trabalho é quase um segundo Orçamento do Estado, pelo que devia ser o primeiro a ter o pulso necessário para “dar uma lição” aos empresários que gostam da imoralidade.
Perdem os empresários honestos e justos, pois a sua sólida formação moral e social não os deixa utilizar as mesmas ilegalidades e as mesmas ferramentas de tortura que permitem aos outros enriquecer. Da mesma forma, nunca são devidamente reconhecidos pelo imenso valor que têm, por gerarem emprego saudável e riqueza para o País.
E perdem, naturalmente, os trabalhadores, que vivem o dia-a-dia laboral como se estivessem a cumprir pena por um crime que não cometeram, com as consequências catastróficas isso tem na sociedade: que adulto será uma criança que é criada pelas educadoras de infância e pelos professores, educada sozinha por um computador ou pela televisão e que só conhece pais emocional e mentalmente doentes com quem convive cinco minutos de manhã e dez à noite?
Um último esclarecimento para aqueles que se negam a aceitar a verdade e que argumentam sempre com as desculpas mais idiotas: eu não gosto mesmo nada dos norte-americanos.
Estive quase para usar alguns exemplos das democracias do Norte da Europa, mas seria acusada de ser admiradora do actual primeiro-ministro. Como dificilmente serei admiradora de um primeiro-ministro, português ou não, preferi engolir o meu racismo e acreditem… não é nada fácil.